A Polícia Federal não tem capacidade de atender os imigrantes que chegam ao
Brasil, segundo um delegado responsável pelo setor no Rio de Janeiro. O trabalho
deveria ser feito por uma agência federal especializada, segundo especialistas
ouvidos pela BBC Brasil.
A substituição da PF por uma Agência Nacional de
Migração para atender os estrangeiros no Brasil é um dos principais pontos do
debate sobre a criação de uma nova Lei de Imigração - cujo projeto tramita há
cerca de três anos no Congresso.
"Não temos pessoal capacitado para essa
tarefa", afirmou o delegado Antônio Ordacgy, chefe do núcleo de estrangeiros da
Superintendência da PF no Rio de Janeiro.
Porém, segundo ele, essa não é
uma posição institucional da PF, mas sua opinião pessoal. A afirmação foi feita
no seminário "Direito dos Migrantes no Brasil: o novo Estatuto dos Estrangeiros
como uma Lei de Migração", que ocorre nesta sexta-feira no
Rio.
Atualmente, entre as atribuições da PF estão o atendimento a
imigrantes que já possuem visto permanente e a fiscalização e eventual
regularização dos estrangeiros que estão no Brasil de forma ilegal. Além disso,
a instituição recepciona os estrangeiros que chegam ao país em portos,
aeroportos e fronteiras.
De acordo com Ordacgy, a PF já cumpre "inúmeras"
tarefas, como a repressão ao tráfico de drogas e de animais silvestres, ao
contrabando e aos crimes de "colarinho branco", e não deveria acumular a função
de fiscalização da imigração.
Agência
Segundo o diretor da organização
não governamental Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante (CDHIC),
Paulo Illes, servidores da PF não aplicam a atual legislação de forma
objetiva.
"Os funcionários deste (novo) organismo deveriam aplicar a lei
de forma objetiva, e não subjetiva, como fazem os agentes da PF",
disse.
Segundo Illes, dos cerca de 43 mil estrangeiros que obtiveram
visto temporário com a anistia concedida pelo presidente Lula em 2009, apenas 19
mil obtiveram a permanência definitiva no Brasil.
"Em muitos casos, o
agente da PF não aceitou os documentos indicados na legislação – como o extrato
bancário – para que o postulante pudesse obter o visto permanente, o que revela
uma interpretação subjetiva da lei", afirmou.
Argentina
A Argentina é
um exemplo de país que já criou um organismo específico para o atendimento aos
imigrantes - a Direção Nacional de Migrações (DNM).
Segundo Federico
Agusti, diretor de Assuntos Internacionais e Sociais da DNM, 423 mil
estrangeiros se inscreveram no plano "Pátria Grande", lançado no final de 2005
para regularizar ilegais na Argentina. Deles, 225 mil conseguiram a residência
permanente até 2010.
"É urgente a criação (no Brasil) de um órgão que
ofereça um atendimento humanizado e disponha de pessoal capacitado, que conheça
de fato a legislação e tenha domínio de idiomas", afirmou Illes.
Nova
lei
Para os especialistas, a integração dos imigrantes não deve se
limitar à regularização de sua situação no país em uma nova legislação. Ela deve
incluir a adoção de políticas como o oferecimento de cursos de português e a
capacitação para o mercado de trabalho.
"A futura lei brasileira de
imigração deverá não apenas permitir o direito à migração, mas considerar a
integração do imigrante na sociedade", afirmou Paulo Sérgio de Almeida,
presidente do Conselho Nacional de Imigração (Cnig), órgão vinculado ao
Ministério do Trabalho e Emprego.
Segundo a legislação que o governo
espera aprovar no Congresso, estrangeiros poderão requerer vistos permanentes a
qualquer momento. Pela lei em vigor, é preciso fazer um requerimento antes de
chegar ao Brasil, por meio de consulados.
Regularização
A mudança fará
as anistias, que vêm sendo concedidas para os imigrantes "irregulares", perderem
o sentido.
"Podemos combater melhor a criminalidade ligada à imigração
através da regularização dos migrantes, ao invés de adotar políticas
restritivas", afirmou o diretor do Departamento de Imigração e Assuntos
Jurídicos do Itamaraty, Rodrigo Amaral.
A permanência de estrangeiros no
Brasil ainda é regida pelo Estatuto do Estrangeiro, instituído em 1980, sob a
ótica da Lei de Segurança Nacional.
Países vizinhos, como a Argentina e o
Uruguai, já aprovaram novas leis de imigração para substituir normas da época de
suas ditaduras militares.
No campo do direito dos migrantes, o Brasil
também está atrasado: é o único país da América Latina que ainda não ratificou a
Convenção Internacional das Nações Unidas para a Proteção dos Direitos de todos
os Trabalhadores Migrantes e suas
Famílias.
Adriana
Marcolini
Do Rio de Janeiro para a BBC Brasil
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/05/120518_imigrantes_am.shtml
/////////////////////
Portugueses no Brasil alertam quem
quer emigrar
por Lusa
Portugueses
no Brasil alertam os novos emigrantes que podem encontrar vários problemas na
busca de oportunidades no país, sobretudo no que diz respeito à regularização de
sua situação e à burocracia pesada.
"Em Portugal, passa-se uma informação
muito errada de como funciona o mercado de trabalho no Brasil, repetem-se os
mesmos chavões de que o país é um bom mercado por excelência, mas para todos os
efeitos, um português no Brasil é um estrangeiro como qualquer outro", alerta
Marcelo Cerqueira, moderador do grupo "Novos Patrícios", que reúne portugueses
no Rio de Janeiro, na rede social Facebook.
Para o português, que está a
abrir um negócio de importação de vestuário, o maior problema para quem quer
abrir uma empresa está na morosidade do sistema brasileiro.
"Em Portugal,
você cria a empresa na hora, basta apresentar os sócios, o modelo do contrato
social, e faz-se o registo. No Brasil demora uns dois meses, se tudo correr bem,
e ainda tem a figura do despachante [profissional que faz a intermediação dos
pedidos aos órgãos públicos], o que aumenta os gastos", ressalta.
As
dificuldades para conseguir um visto de trabalho estão entre as principais
reclamações, principalmente entre os jovens que fazem intercâmbio em
universidades brasileiras e querem ficar a trabalhar.
"O meu visto
demorou cerca de 40 dias para sair, depois que chegou a Brasília, fora o tempo
que gastei antes. Mas dei sorte, tenho amigos que não conseguiram, e as empresas
desistiram de os contratar pela demora", contou à Lusa o engenheiro José
Queiroz, há dois anos no Rio de Janeiro.
Para obtenção do visto de
trabalho é preciso que a solicitação seja feita pela empresa interessada, e não
pelo profissional. A firma precisa ainda explicar por que está a utilizar uma
mão de obra de fora, em detrimento da nacional.
Segundo os portugueses
ouvidos pela Lusa, na maior parte dos casos, as firmas brasileiras não estão
habituadas a esse trâmite e voltam atrás quando percebem a morosidade do
processo.
"Só mesmo os grandes grupos internacionais estão preparados
para contratar estrangeiros porque já fazem isso todos os dias, já têm os canais
certos", afirma Cerqueira.
Queiroz, por sua vez, sublinha que o Brasil
pode até ser o "El Dourado" que se vende em Portugal, mas apenas para alguns
setores.
"Não adianta ser formado em artes cénicas e vir para cá achando
que se vai arrumar emprego fácil. Há vagas em engenharia, mas até para outros
setores relacionados, como arquitetura, já é mais difícil", alerta.
Outra
exigência para o visto de trabalho é um contrato mínimo de dois anos, o que
muitas vezes também desanima as empresas e dificulta a vida de profissionais
autónomos ou "freelancer".
O português Pedro Silva, dono de uma empresa
de incentivo à prática de tênis no Rio de Janeiro, alerta ainda para o fato de a
economia brasileira estar começando a enfraquecer, como consequência dos
impactos da crise internacional.
"Não é preciso ser nenhum economista
para perceber que um país em crescimento como o Brasil não tem como não ser
afetado pela situação que a Europa e outros países estão a enfrentar, o país já
começa a dar sinais de fraqueza", constata.
O conselho de Silva para os
portugueses que ainda pensam em tentar oportunidades no Brasil é chegar com a
mentalidade aberta, com disposição para aprender e adaptar-se às exigências do
país.
"É preciso ter humildade e vir de peito aberto, com vontade de
aprender o 'modus operandi', não adianta chegar achando que já conhece e sabe
tudo porque fomos nós que colonizámos o país há 500 anos, porque cada lugar tem
suas regras", completa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário